sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Liberdade, só a de Mandela





O poeta
declina de toda responsabilidade
na marcha do mundo capitalista
e com as suas palavras, intuições, símbolos e outras armas
promete ajudar
a destruí-lo
como uma pedreira, uma floresta
um verme.

Carlos Drummond de Andrade,
“Nosso Tempo”, in A Rosa do Povo, Editora Record, 2003




Quem pensa me conhecer, só porque leu os meus livros, engana-se. Quem quiser me conhecer não deve ler meus escritos. Os livros estão sempre sete anos atrasados, não dão conta de quem sou.

Exemplo: Meu primeiro livro, “De passagem mas não a passeio”, coleciona uma porção de poemas adolescentes que me apresentam como uma figura irônica e triste de dar dó. Sob uma aparência revolucionária encontramos poemas terrivelmente neoliberais. Libertinos, muito mais que libertários.
Ora, se tem uma coisa que me envergonha profundamente é isso: essa farsa revolucionária, essa vulnerabilidade feminina que os espertos costumam taxar de “libertação”.
Liberdade, ali, só a de Mandela. O resto é balela. Consumo.

Em “Onde escondemos o ouro” - livro que está pra sair –, idem . Embora já não haja aqui nem sombra do que fui, temos ainda a sugestão de um ser extremamente vingativo, pronto para dar o troco.
Sete anos de azar de novo. Não sou mais essa pessoa vingativa. Não quero o Ubiratan morto, embora queira ainda o meu Malote de volta.
Vingança pra mim nem fria nem quente. Na minha mesa só quero sementes que germinem e alimentem a vida em qualquer canto.
O que diz melhor de mim, talvez, sejam os zines. Por serem publicações pequenas, efêmeras e pontuais – simples – traduzem melhor os momentos, compõem mosaicos no tempo.

Mas, se é assim, porque publicar? Porque, se com tantos defeitos, vergonhas e arrependimentos, ainda gasto meu tempo e dinheiro publicando livros?
É porque, apesar dos erros, se salva o discurso. No conjunto, os poemas compõem mosaicos de cristais inquebrantáveis e apresentam o meu desejo de ser útil, de encontrar e reforçar a essência humana, revolucionária, em cada título, em cada página.
A contradição capitalista também mora em mim, apesar da minha luta diária contra esse sistema.
Se publico, é porque quando releio os poemas antigos algo de novo ainda tilinta bem no fundo desse beco esvaziado onde moramos.
E esse tilinto é azul pontilhado de vermelho: semeia a paz nesse campo minado de guerra.

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