sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Poeta vendido, ou livros à venda?

Escolher o anonimato ou viajar pelo estômago do inimigo? Essa é uma das questões geralmente impostas a quem queira fazer literatura na era Capital.
Mesmo àqueles que não desejam se contrapor ao sistema, é imposta a pergunta: “deseja ser lido?”.


Se a resposta for um sim, o escritor ou escritora engajada deverá saber que, em certa medida, precisará estar à venda, pois quem detém o poder econômico detém também o poder de ditar o que é “bom” e merece ser lido, do que é “lixo”, dispensável aos olhos de todos, indigno de ser ensinado nas escolas – o anti-clássico.


Daí que uma angústia corroa os olhos de muitos artistas, deixando-os, por vezes, irremediavelmente cegos: Como vencer o inimigo se, para tanto, precisa aliar-se a seus representantes (as ongs, as produtoras, gravadoras, editoras e outras “oras”) - “empresas- privadas”, máquinas de “mandar à merda” qualquer contra-proposta política?


“Mas há um contrato dizendo:
todo ouro será cobrado
duas vezes no leite
outras tantas na alma,
tantas no sabonete”
1

Walter Benjamin, em o autor como produtor, aponta um caminho. Ele diz que é preciso, no mínimo, romper alguma dessas amarras – pode ser criando sua maneira própria de fazer circular sua arte, ou mesmo trabalhando para se sustentar, ao invés de tentar sobreviver com seu produto artístico.
Daí advém um ponto importante: se o poeta, no caso, não tiver que fabricar poemas para vender, poderá construí-los para viver, para se contrapôr, para apontar caminhos novos e revolucionários. É, em minha opinião, a diferença entre a “arte-vida” e a “arte-sobrevivência”.


Se, por outro lado, uma pessoa resolve que irá se contrapôr ao sistema e, ao mesmo tempo, sobreviver de sua arte, cedo ou tarde estará vendido, fazendo discursos revolucionários e vivendo confortavelmente em algum bairro de classe média alta – alienado do sofrimento contra o qual diz ou aparenta militar. E a criação literária, especialmente a lírica que se dá a partir da ausência, do que faz falta ao sujeito, encontrará terreno fértil, pois o poeta anuncia e valoriza um “estar no mundo” revolucionário, mas sua vida cotidiana – os lugares que frequenta, o seu círculo de amizades, os produtos que consome, são todos contra-revolucionários, adaptados a um modo de vida incompatível com o sonho de um mundo ideal.

1Dinha Preço in: Lição de Chão Zine – ano 5 n. 12 jan. 2008

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