Rompe-me o sono um latir de cães
na madrugada. Acordo na antemanhã
de gritos desconexos e sacudo
de mim os restos da noite
e a cinza dos cigarros fumados
na véspera.
Digo adeus à noite sem saudade,
digo bom-dia ao novo dia.
Na mesa o retrato ganha contorno,
digo-lhe bom-dia
e sei que intimamente ele responde.
Saio para a rua
e vou dizendo bom-dia em surdina
às coisas e pessoas por que passo.
No escritório digo bom-dia.
Dizem-me bom-dia como quem fecha
uma janela sobre o nevoeiro,
palavras ditas com a epiderme,
som dissonante, opaco, pesado muro
entre o sentir e o falar.
E bom dia já não é mais a ponte
que eu experimentei levantar.
Calado,
sento-me à secretária, soturno, desencantado.
(Amanhã volto a experimentar).
RUI KNOPFLI
(1932-1997)
Rui Knopfli
Nasceu em Inhambane, Moçambique. Poeta. Jornalista. Sua estréia deu-se com o livro O País dos Outros (1959). . Lançou, com João Pedro Grabato Dias, os cadernos de poesia Caliban (1971-72), Trabalhou como adido de imprensa, na delegação portuguesa à Assembleia-Geral das Nações Unidas, em Nova Iorque (1974) onde participa dos trabalhos da Comissão de Descolonização. Publicou Memória Consentida (1982) e em 1984 recebeu o prêmio de poesia do PEN Clube.
fonte: http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_africana/mocambique/rui_kinopfli.html
Um comentário:
Eu li este poema numa apresentaçao e adorei le-lo!
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