O sujeito que escreveu o texto abaixo errou quando disse que não se vê (olhos azuis e roupa passada) na TV e na literatura brasileira, pois ele é exatamente o tipo padrão, como Luciano Huk, Angélica, Eliana, Xuxa, Gugu, Maísa. Depois errou também ao dizer que Ferrez escreve errado demonstrando preconceito linguistico e demonstrando também que entende nada sobre linguas. De resto ele fez uma análise acertada sobre o novo passo do que conhecemos por Neo Liberalismo, onde a pobreza deve ser valorizada por conta da exploração que atingiu níveis recordes, e como sabemos o capitalismo sempre se reforma para manter-se. O Ferrez, por exemplo, comentou dia desses, no "Roda Viva", que, no shoping, enquanto a elite faz suas compras triste e deprimida, o faxineiro dança feliz da vida com a vassoura. Faça-me o favor né! pergunta pro faxineiro onde é que ele gostaria de estar e pergunta pro rico se ele quer trocar de lugar com o faxineiro.
Na favela a vida é ruim, sim. É triste e difícil. A gente é que tem uma capacidade extraordinária de sobreviver.Dinha e DuMANOCULTURA E PERIFERISMO
Pobre, preto e favelado não é retratado na televisão e demais obras artísticas realizadas no Brasil. Balela. Há uma hegemonia do populacho no audiovisual e na literatura feita por brasileiros.
Nas telenovelas sempre há um casal formado por um pé-rapado e um rico. E o pobre é o herói. O pobre é íntegro. O rico não presta. Existe um programa chamado Central da Periferia. Quer mostrar que o que vem das áreas carentes é mais legal do que o vem do centro. Na programação esportiva também sempre aparece a história de um atleta que veio do nada e se tornou vencedor. As séries que ganham melhor tratamento estético e dramático das emissoras são aquelas de favela – Cidade dos Homens e Antonia – ou de sertão – A Pedra do Reino.
Os cineastas brasileiros venerados são os que filmam pobre. Vai de Walter Salles com Central do Brasil a Dois Filhos de Francisco, que conta a trajetória de uma dupla de cantores caipiras.
Na literatura se destacam os manos. Tem o Ferréz, do Capão Redondo, um dos bairros mais violentos da periferia sul de São Paulo. Ferréz fala e escreve errado. Mas dizem que ele pode, porque veio do povão. Mas há também os encantados com universo das favelas. Caso de Patricia Melo e Fernando Bonassi. Patricia Melo é autora de O Matador, que foi transformado em filme com o nome de O Homem do Ano.
O fetiche pela ralé é justificado com o seguinte argumento: é o retrato do Brasil. Então eu moro em outro país. E ainda não me dei conta disso.
Onde eu vivo tem favela, é claro. Só que tem umas coisas estranhas. Tipo gente de classes média e alta. Trata-se de um pessoal que vive em edifícios ajeitados e novos. Outros residem em condomínios fechados. Mais ainda: pessoas que ocupam cargos executivos em empresas grandes. Ou profissionais liberais de nível médio e alto.
Outra bizarrice: compram livros, cd’s e dvd’s em megastores de shopping center. Adquirem produtos de marca. Mesmo que seja em dez vezes no cartão de crédito. Mesmo que entrem no cheque especial. Comem no America e tomam café na Starbucks. Se você não conhece a Starbucks, azar seu, provinciano. Vá ler livros ou ver filmes ambientados nas principais cidades do mundo.
Eu não tenho apreço pela cultura dos manos. Assim como não gosto de africanismo, latinismo e caipirismo. Tudo bem que isso exista. O problema é que o ideal politicamente correto quer impor divinização disso. Os selos “africano”, “indígena”, “interior” e “periferia” se tornaram atestados de qualidade inquestionável.
Quem diz que acha tudo isso uma porcaria é tachado de preconceituoso. Ou de elitista. Preconceito não é crime. E eu sou um legalista.
Outra coisa: há também preconceito do lado dos manos. Eles rotulam a classe média de fútil. De gente que só pensa em consumir. Besteira. A empregadinha que pega quatro conduções por dia tem o mesmo desejo de consumo da empresária ou executiva que anda de Mercedes Classe A ou de Toyota Corolla. A garota da favela também gostaria de entrar em um shopping – nem precisa ser o Iguatemi de São Paulo ou, agora, o Cidade Jardim – e sair cheia de sacolas com sapatos, bolsas e roupas. A pobre só não pode.
E quem ganha dinheiro dentro da lei que gaste como quiser. Não há superioridade moral do periférico sobre o central. O populacho também é malvado. Até parece que ninguém bate na mãe ou comete abuso sexual na favela. Até parece que uma comunidade pobre não é capaz de linchamentos.
Pior ainda é achar que o por ser socialmente sofrida a vida da patuléia é mais interessante. Existem conflitos – de vários tipos – em gente de classe média e rica do Brasil que rendem filmes de ficção, documentários, seriados e livros.
O mano de calça larga e boné está altamente retratado. E esse estilo também invadiu os caras de classes mais alta. Eu, branquelo de olhos azuis, que usa camisa, calça mais justa e sapato de bico quadrado é que não me vejo na televisão, no cinema e na literatura feita no Brasil.
Leio os livros passados em Nova York e Londres, para ter contato com personagens que têm a ver com o meu contexto. No dia que um tipo como Ferréz escrever um livro como Os Filhos do Imperador, de Claire Messud, uma história de nova-iorquinos, eu leio. Estou mais para o Diabo Veste Prada do que para Capão Pecado, um dos livros de Ferréz. Quero ler histórias de gente que toma banho e usa roupa limpa e passada. Os escritores que se propõem a falar de classe média no Brasil, na maior parte das vezes, adotam como protagonistas gente sem asseio, que transformam suas casas em lugares sujos.
Ainda bem que existem as séries americanas House, Nip/Tuck, Without a Trace e The Closer. Ainda bem que posso ler Philip Roth e Ian McEwan. Sem eles, eu não suportaria esse monte de mano.
Escrito por Marcelo Amaral às 22h00
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