Durante boa parte do século passado a África do Sul, colonizada por ingleses e holandeses, viveu uma das mais ferozes ditaduras do planeta. O regime do apartheid negava os direitos mais básicos do povo nativo em favor dos privilégios dos invasores brancos.
Qualquer reação, por mais pacífica que fosse, era reprimida com muita violência, como no caso dos mais de 700 estudantes mortos no bairro de Soweto, quando protestavam contra a obrigatoriedade do ensino da língua africânder nas escolas.
Durante décadas, quase três delas vividas na cadeia, Nelson Mandela foi a grande referência da luta contra o regime. Por todo o mundo era grande a pressão pelo fim do apartheid. Até em eventos esportivos como as olimpíadas, a África do Sul era boicotada. Políticos, artistas e intelectuais do mundo todo, gritavam pela libertação de Mandela.
E, apesar de toda a repressão, grupos rebeldes não davam sossego aos ditadores. No fim dos anos 60 surge o movimento Consciência Preta, e com ele emerge o nome de Bantu Stephen Biko, ou, Steve Biko, um de seus fundadores. Esse movimento tinha como objetivo principal resgatar a dignidade do povo preto, feita em pedaços, por todos esses anos de opressão.
“No núcleo desse tipo de pensamento está a percepção pelos pretos de que a arma mais poderosa nas mãos do opressor é a mente dos oprimidos.” Explicou Biko. Além de ter atuado na OESA (Organização dos Estudantes da África do Sul) ele também atuou nos Programas da Comunidade Preta.
Esses programas, centralizados na Igreja da Leopold Street, em King William’s Town, consistiam em projetos de educação, saúde e educação sanitária, entre outros, com destaque para a Clinica Zampilo. Construída numa colina distante da King William’s Town, ela era dirigida por um medico e atendia milhares de trabalhadores rurais que não tinham como ir até a cidade para buscar atendimento. Steve foi detido e proscrito por quatro vezes.
Alguns dos processos por ele sofrido foi por infringir a algumas dessas proscrições, como por exemplo, de falar com mais de uma pessoa ao mesmo tempo. Outro processo era por “frustrar os objetivos da justiça”. Isso significa que seus argumentos convenciam algumas testemunhas a mudarem os seus depoimentos. Nenhum dos processos deu em nada.
Proibido de falar em publico, foi preso quando se dirigia à Cidade do Cabo para um encontro de estudantes pretos. Interrogado sob tortura por mais de 22 horas, não agüentou os ferimentos e morreu no dia 12 de setembro de 1977. Após sua morte, o povo nativo sul africano continuou lutando em diferentes organizações.
A classe dominante branca entendeu que era melhor, então, perder os anéis, mas ficar com os dedos. Libertaram Nelson Mandela, que se elegeu presidente. Isso só foi possível graças ao Acordo de Kempton Park. Apresentado pela classe dominante branca ele foi assinado pelo CNA – Congresso Nacional Africano, partido de Mandela – PCSA (Partido Comunista da África do Sul) e a COSATU (tipo a CUT de lá). Carregado de uma aura de justiça e promessa de dias melhores – reflexo da ascensão de Mandela à presidência – o acordo abolia as instituições tradicionais do apartheid, mas conservava sua essência. Quando o país tinha 4 milhões de soropositivos, o governo Mandela cortou a distribuição de AZT.
Foi nesse governo que quase tudo que era publico foi privatizado. Tudo sob o pretexto de pagar uma divida externa multiplicada nos anos de ditadura, para a aquisição de armamentos para massacrar o povo preto, e tecnologia para o serviço secreto desarticular grupos que combatiam o apartheid. Muitos sul africanos entenderam que esse acordo foi um duro golpe dos invasores na luta contra a dominação branca.
Esses rebeldes que caíram ou que até hoje continuam lutando, compreenderam que nenhuma mudança de fato acontecerá enquanto a minoria eurodescendente tiver em suas mãos as terras e riquezas do seu subsolo – roubadas dos africanos - e os meios de produção.
Eles entenderam e não esqueceram aquilo que já havia sido alertado por Steve Biko: “Racismo e capitalismo são duas faces da mesma moeda”.
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